Pupa de marimbondo-cachorro

Pupa de marimbondo-cachorro
(A seu dispor)

Por Darwin Russo

Está entranhado nas pessoas,
Neste país e em qualquer outro,
Uma vontade espontânea de prejudicar,
Para levar vantagem sempre,
Em qualquer hipótese e a qualquer custo...

Pensa, inculpado, o qualquer um:

"Em primeiro lugar,
Venho eu!

Em segundo, quem me paga.

E não me interessa o seu problema;
Não espere, de mim, ajuda..."

"Você tem que aceitar!

Assim, garoto, é o mundo...
Não adianta lutar. Faça o seu!"

Diria, com fé, a mãe ciosa,
Esperando o filho dobrar-se
À verdade tenebrosa,
Para que ela mesma não sofra...

Quando eu era criança,
Tinha pena de mendigo.
E, generoso, a todos dava
Um rendimento que não era meu.

Antes, hoje,
De qualquer coisa,
De quem me interpela, tenho raiva,
Porque até mesmo o miserável,
Certo dia, me ofendeu.

Por alguma razão que não foi minha culpa;
Pelo mesmo ódio que me corrói;

Por não ver sentido
Na labuta inglória...

Pelo menos,
Ainda que injusto,
Foi sincero e coerente;

Ao contrário de quem nos mete a faca,
Com um "boa tarde", sorridente...

Por trás de toda atitude dessa gente
Tem um interesse financeiro.

Na farinha pouca,
Que nunca sobra,
O pirão deles vem primeiro.

E ai de você, se duvidar do riso!

Terá um motivo, aquela dama,
Ou aquele distinto cavalheiro,
Para darem vazão ao seu veneno,
Carregado e certeiro desde o início,
O ferrão aguardando o momento azado,
De serem eles mesmos
O que sempre foram:

Soldados-amantes do sistema
De lucrar com o sofrimento alheio.

São, infelizmente, a maioria,
A tirar proveito da inocência,
A estraçalhar os sonhos de quem fui um dia.

Com essas lacraias, nem pagando,
Vislumbra-se um pingo de boa fé...

E tal avidez atinge tudo:
Lazer, trânsito, congresso, escola,
Família, governo, tv, igreja,
Hospital, finanças, mercado, audiência,
Imprensa, amizade, arte, trabalho:

"O importante é levar vantagem..."


O terreno, por exemplo,
Onde minha escola pública

Situava-se, outrora,
Hoje é uma concessionária
De carros importados da Ásia,

Anunciados por um gordo estúpido,
Que berra, sem qualquer entrave,

Seus negócios escusos nos meus ouvidos,
Os quais todos acham uma graça!

E eu me pergunto:
Como é possível
Um absurdo desse tipo?!

ESTEJAMOS PREPARADOS!

Pouco importa o resultado.
Qualidade não é seu lema.
(O contratante é sempre um fardo
Que retarda o pagamento)

Desde que,
Em aparência,
Tenham cumprido, depressa, o dever

(Assim mesmo, desleixado,
Inútil, estéril, inacabado),

Qual o asfalto recém instalado
Das cidades brasileiras,
Que, no dia seguinte, se abre,

Como qualquer outro serviço ou produto
De caráter privado ou público:

Como o programa de tv
Daquele obeso estúpido;

Luz, telefone, águas e esgoto,
Bancos, transporte, restaurante,

Seguro, mecânico,
Mantimentos,

Futilidades
E plano de saúde.

Não se pode confiar em coisa nenhuma,
Muito menos em alguma pessoa.

Tudo precário,
Tudo imprestável,

Tudo danificado,
(Como os ovos depois da páscoa...)
E muito caro,

Deficiente, deficitário,
Deletério,
INFLACIONADO,

No feitio venal determinado
Pelos admiráveis patrões,


Segundo o preceito sagrado,
Resguardado em relicário e Cláusula Pétrea
Da "obsolescência programada",

Seguidos pela horda de párias,
Que almejam, um dia, o pináculo,
Usufruindo, milionários,
Quais os chefes, a glória:

Exploradores orgulhosos
Das fraquezas e ganâncias,
Necessidades e gulas,
Medos e misérias!

Ainda que esses débeis lacaios
Recebam apenas uns míseros trocados
Que nunca os tornarão ricos...

(QUÃO APAIXONADA AUTOFAGIA! (?))

E não adianta a revolta
(Para quê?!),
Se reagir você vai preso.

Tente processar os poderosos
E ouça uma gargalhada!

"Quanto você quer no acordo?"
É o que estava previsto.

A causa deles já vem ganha,
Mesmo que a sua cólera seja outra...

Embora a propaganda
Diga que me ama
(Será que alguém ainda acredita nisso?!),
Com o argumento "ecológico",
Ou da "responsabilidade social",
Seu alvo único é minha carteira.

E, para tanto,
Inventam que preciso
De uma carrada de besteira:
Mais um carro, mais uma roupa,
Mais um engodo, mais um evento...

Quando, para mim, bastava uma casa
E talvez uma boa assistência médica,
Desejos impossíveis, se não der uma vida
De economia restrita da renda parca,
Obtida na faina, forçosa, escrava,
Uma vez que NADA se obtem sem dinheiro.

Aflito e inábil,
Apesar dos meus músculos,
Que um teto seguro facilmente ergueriam,
Concluo que nisto jamais serei livre.

Pior que as oito horas por dia,
Junto com pessoas que, na verdade, me odeiam,
Só mesmo a mais suja masmorra.

Eu não tenho tempo para esportes.

Não consigo sequer resolver
Meus problemas cotidianos.

Não me alimento de comida saudável.

As poucas horas que me sobram,
Ansioso, passo no trânsito.

De modo bem diverso do "Éden" utópico,
Simulado, vil e metódico,

Que é propagado,
Com um sorriso falso,
Pela onipresente mídia vulgar.

Não é isso um paradoxo?

E como conseguiria?!

Já que não sou robótico,

Nem um idiota militar...

Deveras sabido, que o contexto perverso,
Com esforço, não alço arruinar,
Me torno eremita em minha casca
E ando às ruas um casmurro,
Com escudo e espada a quem me assola,
Ou que possa me perturbar
Com um choroso pedido de esmola.

Sim, eu endureci!

Virei "homenzinho" como o mundo quis...

E estou criando asas (?!),

Na realidade funesta que a todos cerca,
De torpeza e de desgraça,

Venho me interessando pela bolsa,
A sublimação do homem de hoje.

E, não adianta, não vou sorrir,
Para quem me acha só mais uma peça
Da gigantesca engrenagem de moer almas,
Em troca de taras e notas imundas
Com desenhos de bichos ou de pessoas,
Que, mortos ou à beira da extinção,
Não representam o menor valor
Para aqueles que os desejam.

Penso,
Destarte,
Convicto,

Como qualquer um, em meu caso, faria,

Vencidos a desfaçatez,
A hipocrisia,
O polimento grosseiro

(E, assim, logo, existo,
Pois não sou melhor, nem pior, que ninguém):

"Em primeiro lugar,
Venho eu!

Em segundo,
Quem me atura.

E não me interessa o seu problema...

Quando a consciência fraquejar,
À noite,
Não esperem por MINHA ajuda."

Eu não faço mel.
Não sou seu "parceiro".

Não dou colher de chá.
Nem vou lhe dar sossego.

Mas, posso meter-lhe medo.

Eu sou muito perigoso.
Frio como o gelo.
E quanto mais a ferida inflama,
Mais ateio fogo!

Se fizermos uma mea culpa,
Como a pupa de marimbondo-cachorro,
A humanidade destes dias
Já não tem escapatória.

2 comentários:

Hippies de Ray Ban disse...

Mais um daqueles q tocam pela simplicidade e clareza, Russo. Tamo junto.

Bruno Moreira Lima disse...

Valeu Ulisses! Grande abraço, irmão!