segunda-feira, 16 de abril de 2012

Mon Amour

Mon Amour

A menina do nome francês
Guarda em si uma casa tão bela,
E aconchegante, e farta, e singela
E tão feliz, pois não é só para ela.

Me parece, ela guarda um país,
No sorriso, sincero, que insiste
E impera, qual imperatriz,
Sobre a dor da mais dura mazela.

A menina do nome francês
É de fato uma índia, de força serena,
Que mais vê do que fala e, sem fala, me diz
Sobre o bem que é tão grande e que nela persiste.

Tenho fé nessa bela menina,
Porque a fé que me falta, nela sobeja.
E se ouso rogar, mesmo exíguo de crença,
Dessa vez é por ela, na qual acredito.

Vem direto do peito sua sabedoria
Vem da terra, do vento e de toda ventura
E vem tão meiga, tão leve, tão doce, tão pura,
Que parece-me vir de altivo outro plano...

Por isso, em canto, é que curvo-me e peço:
Seja o mundo também sempre meigo com ela
E lhe dê o que sonha, precisa, deseja,
Já que poucos no mundo merecem tanto.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Rondó da Vovó

Uma singela homenagem a todas as vovós, que estão sempre rezando de coração por seus netos e netas.

Rondó da Vovó

A gota de azeite escorre, caprichosa,
Do dedinho calejado pela incessante costura
Dos fatos de uma vida interessante;

Dos fatos brancos de bodas,
Véus e rendas,
Idas e vindas;

Dos fatos do cotidiano,

Das meninas e meninos criados;

Dos fatos de madeira
Das almas que faltam
E, repentinas,
Ou anunciadas,
Doem deveras;

Dos fatos de luta e simples alegrias,
Que a fizeram firme,
Sem perder a ternura,
Apesar do arrimo de tantos anos.

Nunca
Alguém viu
O óleo misturar em água!

Mas, assim procede,
Naquela reza de palavras estranhas,
Que não podem ser ditas aos domingos
(De macarronadas com frango,
Em porções fartas!),
Italianas e sussurradas
No compasso dos gestos
Das mãos trêmulas...

Ensinou-me a ler
Nos letreiros das lojas
Das quais os produtos eu cobiçava:
Balas, bolas e chocolates!

Mas jamais me revelou aquelas palavras.

E nem poderia...

Sob pena de perturbação

De todo o equilíbrio
Do plano metafísico.

Pois, na tradição Lácia,
Só podem ser transmitidas
Numa noite de Natal,
Pela matriarca,
Às mulheres da família
Que já tenham parido.

E somente faladas!

Não podem ser escritas
Porque perdem a força,
Nunca mais retomada
Em outras tentativas de ensino.

Ouvi do meu irmão,
Que também as conhecia Pirandello
E em seus contos faziam
Quedar ao túmulo os culpados de Napoli.

Não acredito que chegue a tanto,
Se ainda estão vivos meus desafetos.

Pois assim permaneçam!

Com dias felizes, bem longe, me esqueçam.
Para que possa cuidar dos que amo...

Eu, que fui furtado da bolha,
Nem sei se creio na gota.
Mas, criei outra,
Como a sua regente,
Onde não é qualquer um que entra...

Mesmo que fosse truque,
Contudo, Fascinar-me-ia,

Desde criança,

O ritual complexo
De extrair do corpo
O mau olhado alheio,
Com a gota de azeite que se espalha
Pelo prato virgem e branco.

É um singular mistério,
Vez que, com efeito,
Sinto-me mais leve,
Após o sinal da cruz
Feito em minha testa

Com a ponta dos dedos,
Carinhosos,
Que parecem promover o rearranjo
Da Justiça do Universo.

Eu observo,
Atento,
A mágica...

Indo pelo ralo,
Para as profundezas do mar sagrado,
Onde não existe cristão.

Não mais questiono
E mesmo peço
Para usufruir mais uma vez
Desse religioso bocadinho com ela...